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sexta-feira, 28 de novembro de 2025

DESCONEXÃO– A FALTA DE EDUCAÇÃO ATUAL

 DESCONEXÃO, A FALTA DE EDUCAÇÃO  ATUAL


BIA BOTANA


Já era o terceiro ônibus que eu tomava naquela manhã que se aproximava ao meio-dia. Nesta viagem eu estava de pé ao lado do motorista para ver melhor o ponto em que eu queria descer. Vantagens da melhor idade, não ter que pagar passagem e ficar nos melhores assentos. O motorista conversava com um parceiro de ofício sentado próximo e falava em tom sentido de uma passageira que descera, dizendo que ela nem agradecera a ele por a ter esperado, pois a observara correndo para pegar o ônibus. E, como se explicasse o comportamento indelicado da moça, disse conformado: “É jovem…” Desde quando idade pode explicar a falta de educação? Eu comentei em tom consolador, que era culpa dos novos tempos, onde as pessoas se viciaram em se relacionar através de seus celulares e não sabiam mais como se relacionar  na vida real, pois é fato que as pessoas estão mais desconectadas da vida real. Quando desci no meu ponto, não agradeci apenas uma vez por mim, mas disse: “Obrigada,obrigada , obrigada !!! Por todos que não agradeceram e pelos que não dirão!” O motorista riu e disse-me adeus com renovada alegria no coração. 


Hoje, para eu ir aos lugares que não conheço, especialmente repartições publicas, eu preciso fazer um auto convencimento de que tudo vai dar certo. Isso porque, não importa em que lugar do mundo se esteja, vive-se um tempo de extrema violência, por vezes penso que vai chegar em breve o tempo em que teremos que sair de colete balístico, do mesmo modo que se tem um automóvel blindado, tal como eu tenho. 


Na semana anterior dois gatunos de moto foram mortos como ratos na minha rua. Eles tinham assaltado duas mulheres com uma arma de brinquedo e foram alvejados por um policial militar à paisana, que sacou de sua arma e descarregou seis tiros, o detalhe é que eram 21:30 hs da noite de um final de semana prolongado, numa rua movimentada e com ponto turístico próximo. (Link abaixo em Referências). Eu já estava dormindo, mas fui desperta pelo som dos tiros com o coração sobressaltado. Não deu dez minutos e a rua se encheu de sirenes das viaturas policiais, bombeiros e ambulância. Parecia cena dos filmes policiais que adoro assistir. Mas, era realidade. 


No grupo do WhatsApp do condomínio o pessoal celebrava a morte dos ladrões, eu já agradecia a Deus por não ter nenhuma vítima colateral inocente, pois nesta época tem muitas famílias com crianças na proximidade do Aquário.


Este evento explica meus pensamentos sombrios, meu medo de ir ao agendamento para tirar o novo documento de identidade, o CIN - Carteira de Identidade Nacional, no posto regional do Poupatempo


Após analisar os perigos eventuais que eu poderia correr, eu decidi que o meio de transporte mais seguro seria o ônibus, 🚌, pois eu não estaria sozinha e sempre existem “anjos da guarda”, pessoas benevolentes e dispostas a ajudar, e nestas horas minhas maneiras agradáveis e educadas são sempre bem-vinda às pessoas carentes do bom e velho contato humano, principalmente as pessoas que conhecem a dureza da vida e que se alegram com um simples, mas caloroso, “bom dia”.


A minha manhã naquele dia começara com o meu ônibus passando no meu nariz, sem que eu pudesse atravessar a avenida para ir até o ponto. Eu perdera o ônibus por meros cinco minutos, mas depois no ponto a esperar pelo próximo por quinze minutos, eu tive a oportunidade de ter uma conversa divertida e agradável com uma total estranha, mas que se tornou amiga em menos de dois minutos. Tal como as formigas param para se comunicar quando se encontram, o ser humano faz o mesmo e assim se conectam desde que existem.  Do mesmo modo que para tantos outros seres vivos a comunicação é fundamental à sobrevivência também o é para nós, visto que informações trocadas podem oferecer conhecimento útil e conhecimento pode ser muitas vezes o caso de vida ou morte. 


Por fim meu ônibus chegou e eu disse um alegre adeus àquela amizade momentânea, pensando que possivelmente não nos veríamos mais na vida. Na viagem de ida encontrei uma mãe com seu bebê recém nascido, e todos no ônibus ficaram encantados com o pequenino passageiro, desejando proporcionar conforto a eles, numa sincera manifestação de solidariedade, daqueles tipo que aquece o coração e faz com que se tenha fé na humanidade. 


Tudo correu bem no posto público e eu fui muito bem atendida, consegui até me registar como “doadora de órgãos”, pois assim poderei ter alguma utilidade ainda para quem precise, mas a foto do documento ficou horrível! Meu rosto sem um sorriso não é meu, mas de um alienígena de tão estranho. Mas, uma foto ruim de documento sempre será o menor dos problemas. Afinal, eu resolvera tirar o novo documento para não dar trabalho burocrático ao meu filho quando eu morrer, e morta não vou estar sorrindo, ou será que estarei com um sorriso no rosto, feliz por finalmente voltar para casa? 


Na volta, o ônibus que eu devia tomar não passava e acabei pegando outro, e imaginem quem estava no ônibus? A mãezinha com seu bebê,  que pensara que como outras amizades momentâneas eu não veria mais. Mas, nós duas saudamos o reencontro com alegria. Ela satisfez a minha curiosidade e contou que seu bebezinho era um menino e nascera no dia 29 de outubro, um escorpiano! Meu filho nasceu em 31 de outubro, e contei para ela todas as alegrias e agruras de ser mãe de um escorpiãozinho. Quando mãe e filho partiram, eu  dei um adeus cheio de bençãos, com os votos de um Feliz Natal que já se aproxima. 


Desci do ônibus num ponto um pouco longe do laboratório, em que eu iria fazer um exame de sangue de rotina, pois eu sou adepta da medicina preventiva. Eu penso que o milagre de ser saudável está em minhas mãos e depende dos cuidados que eu tenho comigo mesma para não ficar doente. Porquanto, toda cura de doença exige um milagre muito maior, dependendo da medicina e muito mais de Deus. E após fazer o exame e superar meu medo terrível de agulha, eu tomei o meu último ônibus, aquele do início dessa história. 


Quando abri a porta do meu lar, esse lugar amado que se tornou meu refúgio, meu local feliz e onde me sinto seguro, eu agradeci a Deus, não só pela proteção na minha jornada, mas por ter encontrado tantas pessoas boas que alegraram a minha manhã. Eu agradeci por poder me sentir conectada com esta maravilhosa rede humana de vida, que faz qualquer rede social digital parecer pobre de expressão e lamento que muitos não percebam a felicidade que se pode encontrar no contato humano através de uma aproximação com um simples “bom dia”, um “por favor” ou um “muito obrigado”. Porque são estes gestos simples de gentileza gratuita que nos fazem humanos. Se alguém quer “fazer a diferença” verdadeiramente, devia começar com gestos de gentileza, mudando o dia de uma pessoa, reconhecendo que ela existe para você. 


Um dia ouvi a jornalista Glória Kalil dizer algo muito certo, de que “educação é um algodão que se coloca entre copos de cristais para que não se quebrem ao se tocarem”, sem dúvida é uma metáfora perfeita. As pessoas hoje pensam que com seus títulos universitários ou profissionais, com suas riquezas, com o poder social de suas posições, podem se dizer “educadas”, mas esqueceram da educação como seres sociáveis, como se relacionarem, e esta desconexão com as pessoas se faz uma destoante “falta de educação”, A cultura de validação, de autoafirmação pessoal constante, está na razão fundamental de uma sociedade cada vez mais violenta, todos se arrogam a uma importância que não possuem. O sujeito acha que merece tirar de outro o que não lhe pertence, e essa mentalidade do ter direito sem ter obrigação, virou um “costume”, aquele que faz com que se queira levar vantagem em tudo e em qualquer circunstância. Pouco importa se se faz o mal sem se ver a quem, para que fazer o bem e passar por tolo num mundo de espertalhões? Então, se não se pode confiar mais em ninguém, vive-se numa realidade distópico opressiva, autoritária e desumana. É isso que se quer? 


Desde 1989, o médico e neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis estuda o cérebro humano. Recentemente o Dr. Nicolelis disse em uma entrevista:

“O meu receio maior não é an artificial criar superinteligência. Eu acho que isso é só hype comercial que alguns empreendedores usam para aumentar a valorização das suas empresas sem fundamento científico nenhum. O meu grande receio, como a mente humana, o cérebro humano é um grande camaleão e ele se adapta a toda sorte de contextos e circunstâncias que o mundo lhe oferece para sobreviver, se o nosso mundo se transformar todo aqui fora e viver sob a lógica digital, o cérebro humano vai se adaptar a ele. Então nós vamos reduzir a nossa capacidade cognitiva, intelectual e inteligência ao nível dos sistemas digitais. É por isso que eu posso dizer que nós estamos caminhando rapidamente para criar milhões de zumbis digitais”. (Links disponíveis abaixo em Referências) 


Ele está certo, os filmes de terror apresentam monstros humanas em decorrência de doenças virais, mas podemos ser vitimizados pelos alimentos que damos ao nosso cérebro, condenando ele a um processo regressivo, de retardo mental e de estupidez. Isso é assustador. 


Ao final da tarde daquele mesmo dia, chegou-me um e-mail de um breaking news do The New York Times avisando de um tiroteio nas imediações da Casa Branca, em Washington D.C., por volta das três da tarde lá, cinco aqui no Brasil. (Link abaixo em Referências). Mais um dos trágicos ataques com arma de fogo costumeiro nos Estados Unidos, desta feita na véspera da feriado de celebração do “Thanksgiving” (Dia de Ação de Graças), o que talvez explique alguma coisa. Até agora enquanto escrevo, não se sabe a que motivou o homem jovem afegão de 29 anos a deixar sua mulher e cinco filhos na sua casa nos estado de Washington e fazer uma longa viagem até a capital dos EUA, pegar uma Magno, uma arma potente, e descarrega-la contra dois jovens membros da Guarda Nacional, uma mulher de 20 anos e um homem de 24 anos, transferidos para o novo posto no dia anterior, com s missão de “policiar” a cidade para conter a suposta violência urbana alegada pelo atual presidente do país. Os militares responderam ao ataque e feriram o atirador, mas ambos foram também gravemente feridos e a militar mulher veio a óbito um dia depois. Este triste episódio de violência armada em região turística com afluência de pessoas e à luz do dia assomou-se aos outros trezentos e tantos ataques públicos com arma de fogo nos Estados Unidos nos últimos meses, este será apenas mais um que ficará inexplicado e que certamente fornecerá elementos para mais um roteiro de filme com base em fatos da vida real da Netflix. 


Mais uma vez, eu  tive de dar razão ao meu medo de sair da segurança do meu lar, os fatos não deixam dúvida, a sociedade contemporânea é uma sociedade violenta, e a razão disto merece uma reflexão à parte e ficará para o próximo texto. 



REFERÊNCIAS 


https://costanorte.com.br/amp/seguranca/assaltante-morre-e-outro-e-baleado-por-pm-de-folga-no-guaruja.html


https://news.un.org/pt/story/2025/08/1850750


https://www.cartacapital.com.br/entrevistas/boom-da-ia-e-o-maior-delirio-coletivo-da-historia-da-humanidade-diz-miguel-nicolelis/


https://www.nytimes.com/live/2025/11/26/us/national-guard-shooting-dc?campaign_id=60&emc=edit_na_20251126&instance_id=167121&nl=breaking-news&regi_id=211560503&segment_id=211282&user_id=e95568c2cc793512e3e5115bc43992f7


https://abcnews.go.com/amp/US/2-national-guard-members-shot-white-house/story?id=127909642

The suspected shooter was identified as 29-year-old Rahmanullah Lakanwal, who allegedly drove across the country from Washington state to the nation's capital and targeted the Guardsmen, officials said.


https://www.nytimes.com/2025/11/27/opinion/national-guard-shot-dc.html


https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/guardas-baleados-em-washington-prestaram-juramento-um-dia-antes-do-ataque/


https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/suspeito-de-ataque-a-tiros-em-washington-ja-trabalhou-com-cia-diz-diretor/

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